terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Quantas vezes uma mentira precisa ser contada para virar verdade?

Nas festas de final de ano, as conversas giraram em torno das amenidades e dos desafios que os brasileiros enfrentarão em 2017. No contexto da crise eu fui muito questionado sobre o que poderia ser feito para minimizar os efeitos negativos do baixo crescimento do PIB. Como já comentei em postagem anterior a minha previsão para 2017 é de um crescimento em torno de 0,5% caso o Brasil faça escolhas minimamente razoáveis durante o ano. Considero improvável um crescimento negativo e pouco provável, mas possível, crescimento na casa dos 0,8% do PIB. Como o Brasil precisa recuperar as perdas da recessão e compensar o crescimento populacional, é fácil perceber que a velocidade do crescimento do PIB é muito baixa.

Ao citar o exemplo da Coréia do Sul (Coreia do Sul quer tirar de circulação todas as moedas até 2020, http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/12/1838268-coreia-do-sul-quer-tirar-de-circulacao-todas-as-moedas-ate-2020.shtml?mobile) que pretende acabar com o dinheiro em papel moeda até 2020 como uma solução para fazer mais com menos eu fui imediatamente interrompido com a frase: "Não sei em que mundo você vive, as pessoas de mais idade não vão conseguir usar um celular para pagar as suas contas". O autor desta pérola da cultura do atraso recentemente elogiou uma propaganda na televisão do maior banco do Brasil onde uma aposentada envia e-mail de agradecimento ao seu neto por ele ter ensinado como usar. Infelizmente encontramos os partidários da cultura do atraso na elite intelectual brasileira.

O que mais me surpreendeu no caso foi ver uma pessoa acima de 50 anos defendendo o preconceito ao cabelo branco. No caso da propaganda do banco, o preconceito é explicitado ao seu máximo. A situação natural para o ensino da utilização do e-mail (e ela representa uma forte distorção e mentira) seria a mãe agradecer ao filho que ensinou. No entanto, para o banco, o filho que no contexto da propaganda tem mais de 50 anos, não é capaz de aprender a usar o e-mail por causa da sua idade e por isto o neto que é jovem é quem é a pessoas capaz de ensinar a tecnologia para a vovó.

O recado subliminar da propaganda é que tecnologia é um assunto para os jovens e os mais velhos tem enorme dificuldade de aprender a usar as novas tecnologias (o leitor mais atento deve estar neste momento perguntado em qual lugar do universo o e-mail é uma nova tecnologia?). É claro na propaganda que para o banco ligar um computador ou celular e enviar um e-mail é uma tarefa de nível tão grande de dificuldade intelectual para uma pessoa acima de 70 anos que ela precisa ser ensinada para tal. A origem do preconceito ao cabelo branco é resultado direto da falácia da dificuldade do aprendizado das novas tecnologias pelos que tem mais 40 anos.

Não é surpreendente que este banco tenha no seu regimento interno uma determinação de aposentadoria compulsória por idade. Também não é surpreendente que o precário capital intelectual do banco fruto do seu preconceito ao cabelo criasse uma burocracia cara e inútil para a comunicação do cliente com a sua agência. Fazer menos com mais é claramente o lema do banco.
O grande problema dos partidários da cultura do atraso são os fatos. Enquanto uns afirmam que as pessoas de mais idade não vão usar o celular para pagar as contas do dia a dia, os fatos desmentem tais afirmações. Em primeiro lugar existem muitas pessoas acima de 70 anos na Coréia do Sul. A participação delas na sociedade será maior em 2020 do que é em 2017. Os que falam que eu vivo em outro mundo afirmam que os idosos da Coréia do Sul são capazes de usar as moedas virtuais. A limitação existe apenas nos idosos brasileiros. A lógica de tal afirmação não é comprovada por fato algum. Para os defensores da cultura do atraso, os problemas para a adoção da moeda virtual são diferentes entre lugares como Brasil, Estados Unidos, Europa e Coréia do Sul. Para eles, o ser humano tem capacidade de aprendizado diferente em função da geografia. Sou incapaz de entender tal lógica.

O segundo furo dos defensores da cultura do atraso é que todos os dias pessoas acima de 70 anos pagam as suas contas nos supermercados, lojas, farmácias e etc. usando o cartão de crédito. Quem consegue pagar uma compra com o seu cartão de crédito não é capaz de pagar com o seu celular? Infelizmente, é esta a frágil hipótese da cultura do atraso.

Outros fatos desmentem por completo a frágil hipótese da cultura do atraso de que pessoas idosas não vão conseguir usar a tecnologia da moeda digital. Aqui (Myth busted: Older workers are just as tech-savvy as younger ones, says new survey, http://www.techrepublic.com/article/myth-busted-older-workers-are-just-as-tech-savvy-as-younger-ones-says-new-survey/) ali (Cyber idade: pesquisa mostra que os mais velhos estão usando mais as tecnologias!, http://conaz.com.br/portal/pesquisa-mais-velhos-usando-tecnologias/) e ali (Novas tecnologias conquistam a terceira idade com acesso à rede, http://www.jornalcruzeiro.com.br/materia/720041/novas-tecnologias-conquistam-a-terceira-idade-com-acesso-a-rede) estão disponíveis pesquisas que mostram que as pessoas mais velhas tem menos dificuldades com a tecnologia do que os mais novos. Os estudos revelam também que os cabelos brancos brasileiros estão usando intensamente as tecnologias digitais sem grandes dificuldades.

Os ganhos monetários da migração para a moeda virtual são enormes. Os custos para imprimir, armazenar e distribuir o dinheiro em papel em um país de grande dimensão como o Brasil são enormes. Na Coréia do Sul que é um pais eficiente e de pequena extensão territorial, uma nota de 10 won custa 10 won. Aqui no Brasil que é um país de larga extensão territorial o custo deve ser no mínimo o dobro. Este custo é pago pelos impostos. Não é difícil perceber que uma pequena mudança para a rotina dos brasileiros como a moeda virtual pode economizar bilhões de reais por ano e pode fazer a economia crescer mais rapidamente. Infelizmente a cultura do atraso atua com mentiras para impedir que o Brasil supere os seus desafios em 2017.


Para finalizar eu destaco que desde a introdução dos caixas eletrônicos nos anos 1980 no Brasil eu escuto a falácia de que os idosos não vão conseguir usar a tecnologia. Os fatos desmentem as mentiras afirmadas. Eles usam e não precisaram ser ensinados pelos netos. Para os que perguntam em que lugar eu vivo eu respondo que eu vivo no planeta terra no ano de 2017. E complemento dizendo que os arrogantes que acham que o fato deles terem limitações de aprendizagem significa que outros tem as mesmas limitações devem buscar ajuda urgente. Os idosos não têm limitações de aprendizagem e buscam uma sociedade que não jogue no lixo o dinheiro dos impostos. Fazer mais com menos não é cortar o leite das crianças como um prefeito fez. Fazer mais com menos é usar os recursos existentes em 2017 para que o estado brasileiro seja eficaz e eficiente. Os que desejam viver com a tecnologia de 1980 que vivam no passado e paguem a conta. Eu não quero pagar a conta dos gastos inúteis gerada pelos que governam o Brasil desde o ano de 2002. A maior recessão da história brasileira foi gerada pelos arrogantes da cultura do atraso. 

Um comentário:

  1. Sempre objetivo e direto.Estou com 42 anos e já sofri preconceito de idade. Mas como seu texto diz, cultura do atraso. Infelizmente somos governados por pessoas que contribuem e aprovam a cultura do atraso, e fica difícil mudar a visão destas pessoas a curto e médio prazo.

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